A questão ambiental ganhou destaque na agenda pública nas últimas duas décadas. A realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento no Rio de Janeiro em 1992 – a Eco 92 – são factos que revelam a evolução do debate.
No entanto, ainda permanece a tensão entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental. A existência de conflitos de diversas naturezas e a necessidade de um olhar mais crítico sobre eles levaram à produção do livro Desenvolvimento e conflitos ambientais, organizado pelos professores da Fafich Andréa Zhouri e Klemens Laschefski, e publicado pela Editora UFMG.
O livro reúne pesquisas realizadas por antropólogos, geógrafos, sociólogos, engenheiros e economistas apresentadas no I Seminário Nacional Desenvolvimento e Conflitos Ambientais, realizado pelo Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta) da UFMG em 2008. Na avaliação dos organizadores, o conjunto das discussões apresenta visão alternativa ao paradigma da modernização ecológica, que, segundo eles, pressupõe que todos os conflitos ambientais podem ser resolvidos por soluções tecnológicas e consensos políticos. “A partir dos estudos, observamos que a solução para os conflitos ambientais tem limites definidos pelas relações de poder dos atores envolvidos”, afirma Klemens.
Para Andréa Zhouri, a institucionalização da questão ambiental nas últimas décadas, com avanços na legislação e em outros mecanismos políticos, teve também seus impactos negativos, levando ao empobrecimento do debate. “Muitos grupos da sociedade não são reconhecidos como interlocutores legítimos. Dessa forma, o tema é debatido dentro de um determinado enquadramento, o que gera exclusão e define relações de poder”, afirma Andréa.
Nesse sentido, indígenas, quilombolas, camponeses, povos vazanteiros e diversos outros grupos estão à margem desse debate, o que ameaça seus modos de organização social, econômica e cultural.“O fato de uma população se deslocar para outra região em função da construção de uma hidrelétrica mostra que essa decisão não considera que as relações sociais e culturais podem estar vinculadas àquele espaço”, exemplifica Klemens.
Luz sobre as contradições
Para os organizadores do livro, o enquadramento dado à temática do meio ambiente é pouco plural e contaminou a pesquisa na área. “A academia incorporou a ideia de que a consciência e o engajamento pela preservação ambiental são sentimentos universais, e os conflitos agora são apenas de interesses ou técnicos e podem ser solucionados”, avalia Andréa. Para ela, é preciso lançar luz sobre as contradições existentes. “Devemos enxergar que há projetos de sociedade distintos, defendidos por atores sociais em posições diferentes, alguns em vantagem, outros em desvantagem”, ressalta.
Uma tipologia de análise é proposta pelos organizadores da obra no primeiro capítulo, para possibilitar uma leitura mais complexa dos conflitos ambientais. Os casos de maior evidência seriam aqueles em que há disputa pela ocupação de um espaço. Além dos conflitos de ordem territorial, existiriam ainda dois tipos: os espaciais, quando os atores atingidos não são bem delimitados – como os casos de poluição –, e os distributivos, que implicam concentração e escassez de recursos. “Claro que essa tipologia não restringe um conflito a uma categoria. Ela permite enxergar novas facetas e entrelaçamentos que compõem tais situações, pois até pouco tempo atrás apenas a questão territorial era enfocada”, conclui Andréa.